quarta-feira, 25 de maio de 2011

De Rios e Águas


Seguindo o tema das águas, lembrei de um poema de Gabriela Mistral (1889-1957), grande poetisa (Prêmio Nobel de Literatura) e professora chilena, presente em sua Antologia. Deleitem-se.


           Agua


             Gabriela Mistral

Hay países que yo recuerdo
como recuerdo mis infancias.
Son países de mar o río,
de pastales, de vegas y aguas.
Aldea mía sobre el Ródano,
rendida en río y en cigarras;
Antilla en palmas verdi-negras
que a medio mar está y me llama;
iroca lígure de Portofino:
mar italiana, mar italiana!

Me han traído a país sin río,
tierras-Agar, tierras sin agua;
Saras blancas y Saras rojas,
donde pecaron otras razas,
de pecado rojo de atridas
que cuentan gredas tajeadas;
que no nacieron como un niño
con unas carnazones grasas,
cuando las oigo, sin un silbo,
cuando las cruzo, sin mirada.

Quiero volver a tierras niñas;
llévenme a un blando país de aguas.
En grandes pastos envejezca
y haga al río fábula y fábula.
Tenga una fuente por mi madre
y en la siesta salga a buscarla,
y en jarras baje de una peña
un agua dulce, aguda y áspera.

Me venza y pare los alientos
el agua acérrima y helada.
Rompa mi vaso y al beberla
me vuelva niña las entrañas!

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Do Rio


Foto de Rafael Cabral Cruz


As águas passam.
Cada entardecer resplandece em luzes.
Cada um diferente do outro.

O rio flui.
O vento canta nas ramagens.

E
O barco
Espera o mesmo pescador,
Neste mesmo rio
Que não é o mesmo...
Mas continua sendo
A cada dia
O Rio!

E
Nesta onda
Vive o mesmo pescador.
Um mesmo olhar
Que não é o mesmo...
Fitando um destino
A cada dia
Novo!

sábado, 7 de maio de 2011

Um pouco de Nazim Hikmet

Era  tempo de estudo, estava na faculdade e me mudara para uma casa conjugada próxima ao campus da FURG, no centro da cidade de Rio Grande. Às vezes era insuportável a poluição da Refinaria que ficava próxima. Naquela casinha, morava com o estudante de Direito Flávio Xavier, que havia voltado de uma estada na Patrice Lumumba em Moscou. Entre as relíquias que trouxe de lá estava um livro com a tradução para espanhol de um poeta turco, desconhecido para nós, mas que havia escrito poemas que tocavam profundamente o nosso ser. Este poeta era Nazim Hikmet. Revolucionário, foi perseguido e preso em seu país e acabou vivendo a maior parte de sua vida no exílio e na prisão. Nazim Hikmet nasceu em 1901 e faleceu em 1963, quando nasci. Seguem dois poemas do grande poeta turco.

Nazim Hikmet


Carta para Minha Mulher


Quero morrer antes de você.
Você acha que aquele que vai depois
encontra o que foi primeiro?
Eu acho que não.
O melhor seria me cremar
e me colocar num vaso
sobre o aparador de sua lareira.
E garanta que o vaso
seja cristalino,
assim você pode me ver lá dentro…
pode ver meu sacrifício:
desisti de ser terra,
desisti de ser uma flor,
para ficar somente junto a você.
E eu me tornei pó
para viver contigo.
Assim, quando você morrer,
você pode entrar aqui no meu vaso
e então viveremos juntos,
suas cinzas com as minhas,
até que uma noiva tonta
ou um neto rebelde
nos jogue fora…
Mas
a essa altura
já estaremos
de tal forma
misturados
que mesmo vertidos nossos átomos
cairão lado a lado.
Mergulharemos na terra juntos.
E se um dia uma flor selvagem
encontrar água e brotar desse pedaço de terra,
sua haste terá
por certo dois botões:
um será você,
o outro, eu.

Não é que eu
esteja para morrer.
Quero criar ainda outro filho.
Estou cheio de vida.
Meu sangue é quente.
Viverei ainda muito, muito tempo -
ao teu lado.
A morte não me mete medo,
apenas não consigo sentir especial atração pelos preparativos
de nosso funeral.
Mas tudo isso pode mudar
antes que eu esteja morto.
Alguma chance de que você saia logo da prisão?
Algo dentro de mim me diz:
Talvez.


Noite de Outono



Nesta noite de outono
estou pleno de tuas palavras
palavras eternas como o tempo,
palavras pesadas como a mão,
cintilantes como a estrela.
Da tua testa, da tua carne
Do teu coração...
Sinto-me junto das tuas palavras
as tuas palavras carecem de ti
As tuas palavras, mãe
As tuas palavras, amor
As tuas palavras, amiga
Era triste, amar
Era alegre, plenas de esperança
Era corajoso, heróico
As tuas palavras..
eram homens...