quarta-feira, 30 de março de 2011

Um Elogio à Liberdade

Silêncio, localidade de Restinga Seca, RS. Verão. Na modorra da tarde, minha família estava reunida na varanda da casa de meu avô. Nestas ocasiões, meus primos deliciavam nossos ouvidos com música brasileira da melhor qualidade. Mas não é de música que quero falar. A melhor lembrança que tenho daquela tarde foi encher os olhos d´água ouvindo meu tio Alceu Lafourcade Cabral declamar o Cântico Negro de José Régio. Poema que sacode os brios dos acomodados, que nos faz refletir sobre a liberdade. Eu ainda era criança. Guardei este momento como um dos que me conduziram pela senda livre da poesia. Tempos depois, conheci a versão do grande Paulo Gracindo, do espetáculo Brasileiro, Profissão Esperança, em homenagem a Antônio Maria e Dolores Duran, em que dividiu o palco com a imortal Clara Nunes. Como não tenho gravação do meu tio Alceu, recolhi esta interpretação do grande Paulo Gracindo.

Nestes dias, em que a poluição de informações chove sobre nós a cada instante e que, muitas vezes, acaba nos levando como uma sequência de ondas de um tsunami, este poema nos convida a parar e questionar o que é realmente ser livre.

CÂNTICO NEGRO

“Vem por aqui” – dizem-me alguns com olhos doces,
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que os ouvisse
Quando me dizem: “vem por aqui”!
Eu olho-os com olhos lassos,
( Há, nos meus olhos, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali…
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe.
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam os meus próprios passos…
Se o que busco saber nenhum de vós responde,
Por que me repetis: “vem por aqui”?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí…
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas, e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?…
Corre, nas vossas veias, sangue velhos dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos…

Ide! tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátrias, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios.
Eu tenho a minha Loucura!
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios…
Deus e o Diabo é quem me guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: “vem por aqui”!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou…
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou,
- Sei que não vou por aí!

José Régio – Antologia, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1985, p. 31 – 33.


quinta-feira, 17 de março de 2011

Pensante estou


Ao pensar na vida,
Na vida me perdi...
Perdido, nela estou?
Quem sabe nem esteja.
Sinto-me estranho, fora de eixo, vil e acuado.
Ou seria só impressão?
A vida que nos confunde.
Que nos trás momentos e momentos.
Às vezes mais tormentos.
Mas sempre há neste instante de sofrimento
A mão que zela, que conforta.
A mão que ensina e que entorta.
Oh vida! É tão difícil te descrever que por aqui paro de escrever.
E tomo para mim a decisão de somente viver.
Seja na mão certa
Ou na contramão,
Quero ser feliz.
Ser feliz me basta.

Christhian Santana Cunha
Estudante de Gestão Ambiental - UNIPAMPA São Gabriel